A elegância não é apenas na voz. Além de se tornar um dos principais expoentes do rap nacional contemporâneo, Leonardo dos Santos Barreto, mais conhecido como MD Chefe, é conhecido por transmitir sofisticação nas músicas, videoclipes, redes sociais e em aparições públicas.
Agora, após lançar o ótimo Estrela do Rap (2024), que discute representatividade nas periferias e influência com a nova geração, o rapper lançou nesta quinta, 10, um novo disco de estúdio, intitulado Garbo & Elegância, em parceria com o DJ e produtor Papatinho, com uma temática mais leve, despojada e, claro, repleto de luxo.
Quando começou nas batalhas de rima antes de seguir carreira artística, MD (sigla para o apelido, Madruguinha) já tinha ambição de se tornar um grande nome, tanto como cantor quanto como empresário. Hoje, ele colhe os frutos. Com uma carreira consolidada no hip hop nacional, com sucessos como “Tiffany” e “Rei da Lacoste”, o rapper encabeça a gravadora — e produtora — Offlei Sounds, cuja sede fica no Fallet-Fogueteiro, Rio de Janeiro.
Em entrevista exclusiva à Rolling Stone Brasil, MD Chefe revelou que não planejava soltar um novo trabalho tão cedo após Estrela do Rap. No entanto, após falar com Papatinho para ouvir alguns beats e praticar rap — “porque eu creio que também o rap é prática” — o disco começou a ganhar forma”.
Já a decisão de trazer o west coast, gênero regional de hip hop que abrange artistas da Costa Oeste dos Estados Unidos, veio com uma insatisfação do rapper com a cena do rap no Brasil, descrita como saturada pela falta de coragem de grande parte dos artistas.
“Estou muito enjoado do que o pessoal do rap está fazendo. Isso é muito ruim para o nosso mercado, e a gente perde tudo: as coisas inflacionam, [diminui] o interesse e é menos dinheiro, certo? Isso não é legal”, opinou. “O mercado precisa ser rico e rentável”.
“O público está enjoado, quer escutar coisa nova e ninguém está com coragem de fazer. Os nossos artistas são pouco corajosos. Eles não têm ousadia e são poucos que têm. Tanto que os poucos que têm fazem muito sucesso”, continuou. “Essa falta de coragem deixou a cena muito saturada e eu quero trazer uma novidade”.
O rap tá muito saturado no 120 bpm, os rappers tão fazendo a mesma coisa.
Herança musical
Entre os destaques de Garbo & Elegância, está o sample de “Nega Olívia”, clássico de Bebeto, em “Tiramisú”. Inclusive, o ícone da MPB se envolveu pessoalmente com a nova versão e até participou do videoclipe oficial.
Uma curiosidade: a arte de Bebeto é muito importante para MD Chefe. Além de ser admirado pelo rapper, o cantor é muito admirado pelos pais de MD. “Escuto ele em casa há muito tempo. Até cheguei e falei com a minha mãe: ‘Vou te trazer um pensamento: o cantor que foi a trilha sonora do seu namoro com o meu pai tá fazendo um feat com o seu filho, que você não imaginava muitos anos atrás que seria artista’”, relembrou.
Você pode botar qualquer rapper aí para disputar comigo: nenhum deles entende mais de pagode, swing e samba do que eu. Sou um cara muito conhecedor desse gênero musical pela minha herança cultural. Meus pais escutam muito. Sempre fui apresentado à dança e música na minha vida.
Além disso, MD usa outro sample no disco. Na sexta faixa, intitulada “Tá Duro, Dorme”, ele coloca trechos de “Eu sou 157”, clássico dos Racionais MC’s. No momento da entrevista, ele tinha avisado Mano Brown, frontman e cantor do lendário grupo de rap, que usaria a canção, mas ainda não tinha mostrado.
“Sou um artista muito responsável. Talvez isso faça a rapaziada mais antiga me respeitar bastante. Então eu acabo criando uma coletividade forte com eles, como criei com Bebeto e com Brown. Criei uma amizade legal e maneira com ele”, disse.
Abaixo, leia a entrevista completa de MD Chefe com a Rolling Stone Brasil:
Rolling Stone Brasil: Vamos falar de Garbo & Elegância. Como foi o processo criativo do disco? Como ele saiu de uma ideia para este projeto com 8 faixas (contando o remix).
Cara, é o seguinte. Eu tinha acabado de soltar um álbum, o Estrela do Rap. E eu falei: “Pô, vou me dar um tempo, não vou criar nada agora”. Escutei um beat do Papatinho e criei um disco com ele. Resumindo, o plano virou todo ao contrário. Eu cheguei pro Papato: “Acabei de soltar um disco, pretendo fazer um álbum, mas não agora. Vamos fazer algumas músicas, praticar o rap”, porque eu creio que também o rap é prática, então tem músicas que eu faço para praticar o rap e testar algo novo.
E eu trouxe um conceito pra ele, eu falei: “Papato, quero juntar forças com você, porque eu quero trazer o movimento do west coast aqui para o Rio de Janeiro, porque combina, né? O movimento de Los Angeles… o Rio de Janeiro é até bem mais quente que LA em vários aspectos. Quero trazer esse estilo para cá, o west coast, porque o rap tá muito saturado no 120 bpm, os rappers tão fazendo a mesma coisa”.
Quero trazer um movimento novo para o nosso rap, até porque MD Chefe é criador de tendências. Quero continuar criando tendências. [Papatinho topou] e falei para pensarmos num conceito, explorando o estilo de vida litorâneo de um rapper. As pessoas esquecem que nós somos o maior país da América Latina, só que a gente não imprime o nosso estilo de vida tão bem quanto o México e Colômbia. E eu queria imprimir o estilo de vida litorâneo, o estilo de vida latino do Brasil. E eu acho que nenhum rapper fez isso, nenhum outro artista de qualquer outro gênero fez isso.
Eu queria fazer isso e somar as minhas forças com o Papatinho para poder realizar essa ideia. Quisemos usar bastante samples, recortar samples da América Latina, da América Central e do nosso próprio país — como é a minha faixa com Bebeto, “Tiramisù”. E a gente foi juntando.
Resumindo, na segunda sessão a gente já começou a fazer o disco. Foram tantas ideias boas que a gente já falou: “Vamos fazer logo, vamos já soltar!” E começou uma ideia de cinco faixas, depois caiu para três e agora fechamos em oito faixas porque ficou bem encorpado, um universo bem legal. A gente conseguiu, em cada música, mostrar um jeito de ser garbo e elegante. Achamos necessário chegar nessa conclusão de oito faixas somada com o remix.
Rolling Stone Brasil: Que doido! E como você descreveria esse estilo de vida litorâneo do rap brasileiro?
O estilo de vida de um rapper rico e carioca. Eu falo sobre muitas hotelarias que eu frequento. Sou muito detalhista nas coisas que geram glamour nas pessoas. A foto de uma sobremesa de um tiramisù, estar numa suíte do Fasano, passar pela orla carioca à noite e perceber o quanto ela é bonita.
É sobre esse estilo de vida litorâneo, frente ao mar. Você olhar para o mar, para a arquitetura brasileira, e também gostar. Você olhar para vários serviços que trazem essa glamourização das coisas, do estilo de vida. E o carioca tem um estilo de vida muito legal, só que ele não sabe expor. Eu estou expondo um estilo de vida legal que as pessoas não percebem, entendeu?
Rolling Stone Brasil: Entendi super. E na primeira pergunta, você falou que não queria fazer um álbum tão cedo. Estrela do Rap veio logo na sequência de Baby Chefe. Então você está numa sequência de três anos seguidos com álbum…
Álbum é Estrela do Rap e ATG Tape. Entre eles, eu fiz várias tapes Por exemplo, a Tchutchuca Minitape é algo derivado da ATG. Baby Chef é um pré-Estrela do Rap, então eu não conto como discos, nem como álbuns. Eu tenho um disco que é o ATG Tape, tenho um álbum que é o Estrela do Rap e agora eu vou soltar um disco colaborativo.
O resto são mixtapes e tapes que, como a gente sempre acompanha muito a cena lá de fora, vemos essa cultura da mixtape, eu gostaria de trazer elas para cá. Às vezes eu solto um projetinho, mas a nomenclatura: ATG Tape, disco; Estrela do Rap; álbum álbum, estilo rap (4:48) E agora mais um disco, que é o Garbo & Elegância.
Mas prossegue, perdão te interromper.
Rolling Stone Brasil: Magina, obrigado pelo esclarecimento! Enfim, todos esses trabalhos, eu sinto que você está trazendo algo novo para a sua carreira, também para o rap brasileiro. Eu queria entender como você busca se reinventar, também para sair de uma certa zona de conforto e mesmice, porque você poderia seguir o mesmo estilo de “Tiffany”, “Rei da Lacoste”, etc. Só que aí você muda bastante.
Então, Felipe, o que eu creio? Antes de ficar famoso, eu me conheci muito, sabe? Estudei muitos dos meus atributos positivos e observava o que eu precisava melhorar. Isso me deu uma autoconsciência muito grande sobre o que fui capaz de fazer, sabe? Eu sei muito o que o MD Chefe é capaz de fazer. Se o MD Chefe é quiser fazer uma música cantando, ele vai soltar, pô. Eu só não faço ainda porque acho que tem um momento certo das coisas, né?
Percebi muito onde eu posso… tenho muito talento para mostrar. Sou um homem muito abençoado, tenho muito talento para mostrar. Como eu disse, o MD Chefe vai criando as tendências: ele gosta de trazer ideias e tendências novas, gosta de se arriscar. Eu sempre vou procurar o caminho mais ousado, porque eu creio que as coisas mais difíceis geram mais resultados. E o caminho mais ousado também segue essa linha de raciocínio.
Sempre vou procurar algo que as pessoas vão querer fazer. Vou criar uma tendência para as pessoas também replicarem, se identificarem. E mais ou menos eu estruturo os meus projetos assim, como também o próprio Garbo & Elegância, que o MD Chefe sempre teve esse lado meio professor de querer apresentar palavras novas para as pessoas. Garbo é uma palavra que não é muito usada no vocabulário geral. Então a pessoa vai lá na internet e procura o que é Garbo, e tem aquele sentimento de “caraca, agora eu entendi o motivo dele falar sobre isso no álbum!”
Tem todo esse movimento de querer mostrar coisas, mas isso também foi muito através do MD se conhecer ao longo dos anos e entender do que eu sou capaz de fazer. De procurar e me esforçar para fazer coisas novas.

Rolling Stone Brasil: Por falar em Estrela do Rap (inclusive, acho “Espelho Interlúdio” maravilhosa)… o tom dele é muito mais sério e introspectivo em relação a Garbo & Elegância, que é mais debochado, uma outra vibe.
Porque o Garbo & Elegância é mais entretenimento. Estrela do Rap é as coisas que o MD Chefe pensa. Garbo & Elegância são as coisas que o MD Chefe faz.
Rolling Stone Brasil: Por que neste novo disco você trouxe essa perspectiva mais leve e despojada?
Boas palavras, leve e despojada. Estrela do Rap foi um disco muito sério. Se eu soltasse outra coisa agora muito séria — não que seria a mesma coisa, pois não seria — teria vibes parecidas, entendeu? Eu queria dar um tempo das pessoas esperar um pouquinho: vira uma coisa séria agora e depois vamos fazer um pouquinho de entretenimento.
Decidi soltar algo mais de entretenimento agora. Daqui a pouco eu solto algo mais sério novamente para as pessoas poderem automaticamente julgarem algo parecido, por ser sério também. Garbo & Elegância tem alguns temas muito sérios, mas falo de uma forma mais animada, não tão introspectiva. Mas com certeza é um álbum, predominantemente, mais entretenimento. São coisas que as pessoas vão querer se ver, por exemplo, vão querer fazer.
Rolling Stone Brasil: Inclusive, ele é muito influenciado pelo West Coast. Qual tipo de abordagem você quis trazer?
Seja mais específico, abordagem com o quê? Com o uso do West Coast?
Rolling Stone Brasil: Essa abordagem desse novo gênero que você está trazendo, também. Essa adaptação, por assim dizer. É um disco muito brasileiro. Você não está replicando a fórmula da gringa.
Legal que você teve essa percepção. Então o disco está bem feito. Felipe, estou muito enjoado do que o pessoal do rap está fazendo. Isso é muito ruim para o nosso mercado, que está saturado, e a gente perde tudo: as coisas inflacionam, [diminui] o interesse e é menos dinheiro, certo? Isso não é legal.
O mercado precisa ser rico e rentável. E aí estou falando ao nível de entretenimento para o público. O público está enjoado, quer escutar coisa nova e ninguém está com coragem de fazer. Os nossos artistas são pouco corajosos. Eles não têm ousadia e são poucos que têm. Tanto que os poucos que têm fazem muito sucesso.
Essa falta de coragem deixou a cena muito saturada e eu quero trazer uma novidade. Como eu disse e repito: gosto de criar tendências e de ir contra a maré. Foi assim quando eu estourei com a ATG Tape, “Rei da Lacoste” e “Tiffany”, que era uma faixa totalmente diferente do que acontecia no mercado. Quero fazer isso mais uma vez — de uma forma bem diferente, claro.
E, pô, o que combina com o verão? O que tem a ver com o Rio de Janeiro? O que tem a ver com o estilo de vida litorâneo? West coast tem tudo a ver. Fiz ele a minha cara e do Brasil. É um west coast do Brasil. Eu e Papato conseguimos fazer ele tomar uma forma que seja a cara do Brasil, mas que seja um ritmo diferente do que as pessoas estão acostumadas a ouvir.
Rolling Stone Brasil: Por falar nesses subgêneros… Eu vejo muita gente falando que você é mais do trap, mas sempre te enxerguei como rapper, mesmo. Agora eu queria saber de você.
Eu sou rapper, né? De qualquer forma. Eu acho que essa separação, de rapper para trap, é ignorante, de falta de conhecimento das pessoas. Trap não deixa de ser rap porque é uma maneira própria que as pessoas de Atlanta tem de fazer rap, que é dos Estados Unidos. Lá, existe uma coisa que, se você é de uma área e canta como essa área canta, você faz Memphis. Se você canta igual a Atlanta, você faz trap. Você vai ver um jeito próprio das pessoas cantarem em cada lugar.
Esses subgêneros, na verdade, são o jeito do pessoal daquele estado fazer rap. É como se, por exemplo, tivesse o “Rio de Janeiro Rap”, o “São Paulo Rap”. É isso, entendeu? Mas não deixa de ser rap. Claro estou aí fazendo trap, sou um artista do trap e vim dessa geração. Tenho esse sangue do trap nas minhas veias, mas eu não deixo de ser um rapper.
E eu concordo com você: a minha qualidade de rima como rapper também é muito boa, então eu consigo fazer um Boom Bap lindo, e no trap eu vou fazer lindo, também.) Acho que as pessoas ignoram e não entenderam ainda o conceito de rap, trap e tal. O jeito certo de se chamar um rapper é de rapper, mesmo.

Rolling Stone Brasil: Concordo! Um grande colaborador desse projeto é Papatinho, né? Como foi trabalhar com ele?
Só trabalhei com Papato uma vez [antes de Garbo & Elegância]. Foi com uma publicidade para as Casas Bahia, onde tinha a Marília Mendonça. Inclusive, foi o último trabalho musical dela Marília Mendonça. Também tinha Péricles. Foi o primeiro contato musical com Papato.
Porém, sempre estivemos juntos em muitas ocasiões, mas nunca tínhamos trabalhado juntos. Foi uma ótima oportunidade porque fizemos logo um disco inteiro juntos. Fez mais sentido pela agenda e carreira que Papato tem, pelo que MD Chefe e Papato representam. O ritmo do Papatinho é muito parecido com o meu.
Eu sou louco por trabalho, Felipe. O único trabalho que minha equipe tem comigo é tentar fazer eu descansar porque eu trabalho o tempo todo. Às vezes, na sessão de estúdio, algumas coisas que me impediam de trabalhar com outras pessoas é ter um ritmo muito acelerado. Trabalho muito, às vezes as pessoas são mais contidas.
O Papato não dorme se não terminar algo. Se ele tá no estúdio, foi para casa e não terminou algo, ele volta para o estúdio. Ele não fica em paz se não terminar de trabalhar. Fluiu de forma muito natural, muito presencial. Fizemos quase todas as sessões juntos, só as últimas que ele começou a viajar, foi para os Estados Unidos fazer outras coisas. Eu também tive outras coisas para fazer.
Do início até 90% do disco foi presencial, uns 10% foram mixagem e masterização, que era algo que a gente podia fazer das nossas casas e dos nossos estúdios. A gente saía do estúdio às 10h. Foi um álbum bem cansativo e gostoso de fazer.
Papato também é um cara imperativo. Eu sou um cara calmo, mas eu sou imperativo no meu modo de ser, Ele também é todo agitado, trabalhava para caramba. Por exemplo, na faixa “Bandeira” ele assobia, a ideia veio do nada depois que um cara assobiou sem querer. Ele olhou pro cara e falou: “Mano, assobia dessa forma”. Gravou o cara assobiando e fez um beat. Esse é um exemplo do quão criativa é a mente dele.
Sou um cara que não escreve as próprias músicas no papel. Faço tudo de cabeça e fico rimando o tempo todo. Foi um processo muito bom de criar, as faixas saíram muito naturais e rápidas. Foi bem legal.
Rolling Stone Brasil: Inclusive, Garbo & Elegância tem sample de uma lenda da MPB que é o Bebeto, na música “Tiramisù”. Como rolou essa aproximação com ele?
Vou contar uma curiosidade para vocês, Felipe. Você pode botar qualquer rapper aí para disputar comigo: nenhum deles entende mais de pagode, swing e samba do que eu. Sou um cara muito conhecedor desse gênero musical pela minha herança cultural. Meus pais escutam muito. Sempre fui apresentado à dança e música na minha vida.
Bebeto foi a trilha sonora do namoro dos meus pais, sabe? Escuto ele em casa há muito tempo. Até cheguei e falei com a minha mãe: “Aí, mãe, que sensação maneira, vou te trazer um pensamento. Olha que legal: o cantor que foi a trilha sonora do seu namoro com o meu pai tá fazendo um feat com o seu filho, que você não imaginava muitos anos atrás que seria artista”.
Eu me descobri muito cedo, sempre tive apoio dos meus pais desde muito cedo, mas com oito, 10 anos eles não iam achar que eu ia ser artista. Com 12, sim, mas eu trouxe esse pensamento para ela. É algo legal e poético, né? Tem todo esse contexto de Beto como parte da minha infância, vida e herança musical. E agora passo adiante. Minha filha tem dois anos e canta direitinho Bebeto.
Teve toda essa poesia da vida.
Rolling Stone Brasil: Falando nisso, adorei o sample de “Eu sou 157” em “Tá Duro, Dorme”. Você sente que tem uma responsabilidade muito grande para fazer essa referência aos Racionais?
Sou um artista muito responsável. Talvez isso faça a rapaziada mais antiga me respeitar bastante. Então eu acabo criando uma coletividade forte com eles, como criei com Bebeto e com [Mano] Brown. Criei uma amizade legal e maneira com ele.
Na verdade, eu já queria ter feito uma referência para os Racionais há algum tempo, mas eu não tinha achado ainda o timing ou música certos para isso. E aí essa música com o tema tinha tudo a ver e eu falei: “Agora é a hora!” Sou um cara ousado e gosto de trazer boas referências.
Falei: “Pô, essa aqui é uma boa hora de trazer uma referência para os Racionais”. E aí encaixou, deu certo. O tema é muito o que os Racionais alegavam muitos anos atrás. Eu nem mandei essa música pro Brown ainda, vou mandar para ele ouvir. Mas avisei que usei o sample.
Rolling Stone Brasil: E como é comandar a gravadora e produtora Offlei Sounds? E o que te motivou deixar a sede da empresa no Fallet-Fogueteiro, onde você cresceu?
Inclusive, eu estou nela agora. É o estúdio dourado da Offlei, douradão. Essa é a gravadora que tenho com DomLaike, meu sócio e irmão. Há muitos anos, Offlei sempre existiu como um coletivo, uma gangue, uma tropa. Sempre existiu, mas agora estamos conseguindo materializar um pouco mais o nosso sonho: ser uma gravadora e produtora.
Lembro da gente na Praça do Rio Comprido, onde comecei a batalhar pensando: “Precisamos ter um nome e fazer uma gravadora”, porque a gente sempre viu as pessoas no rap se movimentando errado. E a gente queria ser os caras que se movimentassem certo e parecer um exemplo do que é certo, um exemplo de profissionalismo no rap. Esse foi o intuito da Offlei Sounds.
E a lei também nunca funcionou para nós, por isso o nome da gravadora é Lei Desligada. Esse ato, esse grito político também existe. Então, Felipe, depois de muitos anos, a gente conseguiu criar, tomar forma e materializar a gravadora. Quase todos os nossos artistas são daqui da nossa área.
Temos todo um lance familiar muito forte. A gravadora se entende muito, porque nós passamos por muitas coisas juntos. Como eu disse, a gente era uma tropa antes de ser uma gravadora. Foi cada situação dura que a gente já passou, cumpadi.
Nós somos artistas, são nossos irmãos e tende a crescer mais. Claro que chegou no momento da gente levar a sede para outro lugar mais comercial. Porém, essa sede aqui vai permanecer, vai virar uma produtora e permanecer no Fallet-Fogueteiro. Nós temos a filosofia de que temos que ser o espelho, e você só consegue ver esse reflexo em alguém se você ver essa pessoa perto de você.
Às vezes, uma criança que tem uma condição muito precária de vida vai falar para a mãe que quer ser o Neymar, mas a mãe dela, sem ser mal-intencionada, vai desacreditar porque não vê o Neymar passando na favela. Eu coloco o Neymar como exemplo, porque o estilo de vida dele é muito complexo.
Mas eu gosto de me fazer presente por isso, porque se a criança falar que quer ser o MD Chefe, e a mãe me vê ali com a produtora, ela vai dar o apoio para o filho. E eu sei o quanto o apoio dos pais é importante na nossa vida porque eu tive o apoio dos meus pais.
Quero estar perto e ser essa energia boa e exemplo. A Offlei quer ser esse exemplo e pé firme na história da vida das pessoas. Esse é o motivo de a gente ter uma produtora aqui.
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Fonte: rollingstone.com.br