A América era um lugar estranhíssimo em 1975 — mas o que havia de mais estranho era a música. Toda a cultura passava por mudanças rápidas. Foi o ano em que Tubarão inventou o blockbuster hollywoodiano. Saturday Night Live revolucionou a comédia televisiva. O governo finalmente capturou a fugitiva Patty Hearst. Muhammad Ali venceu Joe Frazier na luta Thrilla in Manila. A Guerra do Vietnã chegou ao fim. Cher se casou com Gregg Allman — e pediu o divórcio nove dias depois, um recorde mesmo para os padrões dos anos 1970.
Você podia ficar em casa com seu novo Pet Rock para assistir The Jeffersons, Starsky and Hutch, All in the Family ou Welcome Back, Kotter. Ou podia ir ao cinema ver Um Dia de Cão, Nashville ou The Rocky Horror Picture Show. O Cincinnati Reds venceu o Boston Red Sox na World Series. Seu anel do humor ficou roxo. Rod Stewart posava com Britt Ekland na capa da Rolling Stone. Nova York vivia a era do “Ford to City: Drop Dead”. Bill Gates e Paul Allen fundaram a Microsoft. Mary Tyler Moore teve um dia difícil no funeral do Palhaço Chuckles. Judy Blume publicou Forever. E todo mundo na pista de dança fazia o Hustle.
No rádio, o maior sucesso do ano foi “Love Will Keep Us Together”, de Captain and Tennille. Tivemos clássicos eternos do rock com lendas como Bruce Springsteen, Pink Floyd, Joni Mitchell, Led Zeppelin, Bob Dylan e Neil Young. Recebemos o funk cósmico do Parliament-Funkadelic. Freddie Mercury estabeleceu um novo recorde para o maior número de “Galileos” em uma única música. Disco, punk, reggae e metal estavam em ascensão. Willie Nelson revolucionou o country fora-da-lei com Red Headed Stranger. Stevie Nicks e Lindsey Buckingham entraram para o Fleetwood Mac. O Kiss se tornou uma super banda com Alive!
Então vamos ao que interessa: os 75 melhores álbuns de 1975, com uma playlist de faixas essenciais de cada LP. Alguns desses discos são clássicos famosos, amados no mundo inteiro. Outros são cults, tesouros escondidos, raridades ou obras únicas. Temos prog, dub, afrobeat, art rock alemão, soul, pop descartável, jazz, honky-tonk, psicodelia brasileira, KC and the Sunshine Band. Alguns foram sucessos estrondosos; outros fracassaram. Mas todos esses álbuns de 1975 têm algo em comum: ainda soam incríveis em 2025. Como diriam em Rocky Horror: Let’s do the time warp again.
75.ABBA – ABBA
74.Ohio Players – Honey
73.Crosby and Nash – Wind on the Water
72.Harold Melvin and the Blue Notes – To Be True
71.Elton John – Rock of the Westies
70.The Miracles – City of Angels
69.Joan Baez – Diamonds & Rust
68.Curtis Mayfield – There’s No Place Like America Today
67.Thin Lizzy – Fighting
66.Shirley and Company – Shame Shame Shame
65.Steve Hackett – Voyage of the Acolyte
64.Jefferson Starship – Red Octopus
63.Latimore – Latimore III
62.The Eagles – One of These Nights
61.Nils Lofgren – Nils Lofgren
60.Rufus featuring Chaka Khan – Rufus featuring Chaka Khan
59.Waylon Jennings – Dreaming My Dreams
58.Jeff Beck – Blow by Blow
57.The Band – Northern Lights – Southern Cross
56.Keith Jarrett – The Köln Concert
55.Trilha sonora deThe Rocky Horror Picture Show
54.War – Why Can’t We Be Friends?
53.Rush – Fly by Night
52.Paul McCartney and Wings – Venus and Mars
51.The Grateful Dead – Blues for Allah
50.Lee Perry and the Upsetters – Revolution Dub
49.The Who – The Who by Numbers
48.Minnie Riperton – Adventures in Paradise
47.AC/DC – T.N.T.
46.Bonnie Raitt – Home Plate
45.Al Green – Al Green Is Love
44.Gary Stewart – Out of Hand
43.Roberta Flack – Feel Like Makin’ Love
42.Elton John – Captain Fantastic and the Brown Dirt Cowboy
41.Heart – Dreamboat Annie
40.The Spinners – Pick of the Litter
39.Guy Clark – Old No. 1
38.Parliament – Chocolate City
37.Emmylou Harris – Pieces of the Sky
36.The Isley Brothers – The Heat Is On
35.Miles Davis – Agharta
34.Betty Davis – Nasty Gal
33.The Bee Gees – Main Course
32.Gilberto Gil & Jorge Ben – Gil e Jorge / Ogum Xangô
31.Kiss – Alive!
30.KC and the Sunshine Band – KC and the Sunshine Band
29.Kraftwerk – Radio-Activity
28.Funkadelic – Let’s Take It to the Stage
27.Aerosmith – Toys in the Attic
26.David Bowie – Young Americans
25.Paul Simon – Still Crazy After All These Years
24.Fela Kuti & Africa 70 – Expensive Shit
23.Black Sabbath – Sabotage
22.Fleetwood Mac – Fleetwood Mac
21.Burning Spear – Marcus Garvey
20.Queen – A Night at the Opera
19.Steely Dan – Katy Lied
18.Bob Marley and the Wailers – Live!
17.Brian Eno – Another Green World
16.Earth, Wind & Fire – That’s the Way of the World
15.Richard and Linda Thompson – Pour Down Like Silver
14.Smokey Robinson – A Quiet Storm
13.Bob Dylan and the Band – The Basement Tapes
12.Willie Nelson – Red Headed Stranger
11.Roxy Music – Siren
10.Led Zeppelin – Physical Graffiti
9.Neil Young and Crazy Horse – Zuma
8.Joni Mitchell – The Hissing of Summer Lawns
7.Pink Floyd – Wish You Were Here
6.Toots and the Maytals – Funky Kingston
5. Bruce Springsteen – Born to Run
A primeira vez que Bruce Springsteen ouviu o álbum que salvaria e definiria sua carreira, ele o jogou na piscina. Anos depois, contou à Rolling Stone que tinha medo “de lançar aquele disco e simplesmente dizer: ‘Bem, é isso que eu sou’, por todos os motivos óbvios que fazem alguém ter medo de se expor”. Born to Run é o som da confiança e da vulnerabilidade de um grande artista, esperanças e medos correndo lado a lado numa corrida de arrancada em alta velocidade, com tudo e nada a perder. É uma declaração total de identidade, que ainda ressoa não importa quantas vezes você já tenha ouvido “Thunder Road”, “Born to Run”, “Jungleland” ou “Backstreets”. Mas o que faz desse álbum uma grande obra — uma grande obra de arte — é o modo como o “É isso que eu sou” de Springsteen nos ajuda a entender um pouco mais quem nós somos. —J. Blistein
4. Neil Young – Tonight’s the Night
Tonight’s the Night é o capítulo final da famosa “trilogia da sarjeta” de Neil Young, e é ainda mais sombrio do que Time Fades Away e On the Beach, funcionando como uma “carta sobre overdose” escrita enquanto ele lidava com a morte do guitarrista Danny Whitten e do roadie Bruce Berry. Reunido em um estúdio improvisado com Billy Talbot e Ralph Molina, do Crazy Horse — primeira vez juntos desde a morte de Whitten — além de Ben Keith e Nils Lofgren, Young processou seu luto em melodias cruas e desfiladas, embriagadas de uísque, que desorientariam ouvintes por décadas. A faixa-título soa como um canto fúnebre, adequado a uma sessão espírita, e você pode realmente ouvir esse ritual começar em “Come on Baby Let’s Go Downtown”, onde Whitten aparece nos vocais. “Albuquerque” e “Mellow My Mind” estão entre os momentos mais honestos e ternos da discografia de Young, enquanto “Tired Eyes” funciona como uma continuação de “The Needle and the Damage Done”. Gravado dois anos antes e engavetado, o disco só foi lançado quando Young decidiu que sua obra assombrada estava pronta. E desde então, nunca deixamos de ouvir. —A.M.
3. Parliament – Mothership Connection
O Afrofuturismo deve tudo ao Parliament, e o álbum Mothership Connection é um dos pilares do conceito. Trata-se de uma obra imaginativa que retrata um encontro entre astronautas negros e extraterrestres no espaço sideral, com inspirações em Star Trek e 2001: Uma Odisseia no Espaço, além de discos conceituais como Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, e Tommy, do The Who. O resultado é puro funk, com George Clinton assumindo facilmente o papel de DJ da nave-mãe, transmitindo direto da “Via Láctea de Chocolate”. O álbum se tornou tão fundamental para o funk quanto para a música pop, sendo amplamente sampleado no hip-hop por décadas. A nave-mãe também virou um símbolo central nas apresentações ao vivo da banda durante o restante dos anos 1970. O disco ainda gerou um dos maiores sucessos do grupo: “Give Up the Funk (Tear the Roof Off the Sucker)”, seu primeiro single a vender um milhão de cópias. —B.S.
2. Patti Smith – Horses
“Jesus morreu pelos pecados de alguém, mas não pelos meus.” Algum álbum já começou de forma tão impressionante? Quando lançou Horses, seu disco de estreia, Patti Smith ainda era praticamente desconhecida, mas rapidamente a obra virou referência do punk rock — estilo que ela fundiu com sua paixão pela poesia. Smith subverte um clássico de Van Morrison (“Gloria”), reflete sobre a pobreza (na desafiadora “Free Money”) e apresenta uma odisséia de 10 minutos repleta de figuras reais e literárias (“Land”), tudo com a ajuda de uma banda impressionante: o guitarrista Lenny Kaye, o pianista Richard Sohl, o baixista Ivan Kral e o baterista Jay Dee Daugherty, além de John Cale, do Velvet Underground, na produção. A capa icônica em preto e branco, em que Smith posa de forma andrógina com um casaco preto sobre o ombro, foi clicada por seu muso de Just Kids, Robert Mapplethorpe. “Sou uma garota fazendo o que os caras costumavam fazer”, ela disse à Rolling Stone em 1976. “A maneira como eu me visto, os objetivos e as coisas que quero ajudar a realizar através do rock.” Missão cumprida. —A.M.
1. Bob Dylan – Blood on the Tracks
Bob Dylan chocou o mundo com Blood on the Tracks, o álbum em que ele canta com uma nova e ardente voz adulta — um homem em dor, remoendo amores perdidos enquanto segue seu caminho. Ninguém imaginava que ele ainda carregava tamanha paixão. Dylan criou o disco enquanto seu casamento desmoronava, cantando “Tangled Up in Blue” com intensidade brutal. Foi o maior retorno do rock, ressuscitando sua carreira após anos de discos sem brilho e canções educadas demais. Mas também é o álbum definitivo sobre términos amorosos. Quando se está sofrendo de coração partido, nada bate tão forte quanto ouvir Dylan lamentar em “You’re a Big Girl Now”, destilar raiva em “Idiot Wind” ou aceitar seu destino com resignação em “If You See Her, Say Hello”. Ele é um “Valete de Copas” levado pelo acaso, cruzando Delacroix, Montague Street, São Francisco, Ashtabula, a represa de Grand Coulee e até o Capitólio. Só o modo como ele canta “You’re gonna make me give myself a good talking-toooo” já valeria um Prêmio Nobel.
Blood on the Tracks foi um sucesso imediato de crítica e público. “Muita gente me disse que adorou o álbum”, contou Dylan. “É difícil me relacionar com isso — digo, as pessoas gostando desse tipo de dor.” Mas, nos últimos 50 anos, Blood on the Tracks virou um disco ao qual todos recorrem em tempos difíceis. Especialmente quando o amor termina e tudo o que resta é um coração espremido como um saca-rolhas. —R.S.
Essa matéria é uma tradução da Rolling Stone publicada em 16 de abril de 2025. Leia a versão original aqui.
Colaboradores: Jonathan Bernstein , Jon Blistein , David Browne , Mankaprr Conteh , Jon Dolan , Will Dukes , Andy Greene , Joseph Hudak , Maura Johnston , Julyssa Lopez , Angie Martoccio , Michaelangelo Matos , Larisha Paul , Mosi Reeves , Rob Sheffield , Brittany Spanos , Alison Weinflash.
Fonte: rollingstone.com.br