Uma das bandas de rock mais bem-sucedidas da história, o Kiss também colecionou alguns tropeços ao longo de sua trajetória. O criticado filme Kiss Meets the Phantom of the Park (1978), a iniciativa de lançar quatro álbuns solo simultâneos, o pretensioso disco Music from the Elder (1981), o anúncio das voltas de Ace Frehley e Peter Criss para logo após excluí-los secretamente do registro de reunião Psycho Circus (1998), a confirmação de uma turnê de despedida na virada do século que não representou uma aposentadoria de fato… a lista é longa e, claro, compreensível, pois só vacila quem está na pista.
Todavia, na opinião de Gene Simmons, o maior erro da carreira do Kiss não teve a ver com a banda em si. O vocalista e baixista considera que ele, o guitarrista/também cantor Paul Stanley e o empresariamento de seu grupo jamais deveriam ter deixado de apostar no Van Halen no meio dos anos 1970.
Simmons é reconhecido como o descobridor do quarteto formado por David Lee Roth (voz), Eddie Van Halen (guitarra), Michael Anthony (baixo) e Alex Van Halen (bateria). O “linguarudo” assistiu a um show da banda na casa noturna Starwood, ficou de queixo caído e logo se ofereceu para trabalhar com eles.
O cantor e baixista chegou a produzir uma demo, registrada em 1976 e hoje conhecida como Van Halen Zero. A ideia era que o grupo assinasse com seu próprio selo, Man of a Thousand Faces, e o material fosse utilizado para “vendê-los” a outras gravadoras. Todavia, razões diversas fizeram Gene abandonar o projeto.
O próprio Kiss vivia seu auge de popularidade na época, o que tornava inviável dedicar mais tempo e recursos para fazer outra atração crescer. E, acima de tudo, os parceiros Paul Stanley e Bill Aucoin (empresário dos mascarados) demonstraram pouco interesse, levando Simmons e sua banda e gestão como um todo a caírem fora.
Em sessão de perguntas e respostas no cruzeiro Kiss Kruise em 2021 (via Blabbermouth), Simmons culpou Stanley — que estava ao seu lado no momento — pela situação. Ele disse:
“Cometemos um grande erro — um. Havia uma banda chamada Van Halen. Eles tinham contrato com a Man of a Thousand Faces Inc. Havia uma demo de 24 faixas. Eles eram totalmente donos da demo, assinaram, ficaram felizes e queriam assinar conosco, mas nós dissemos ‘não’.”
Paul, curiosamente, discorda de Gene. O vocalista e guitarrista não enxergou a situação como um erro. Pelo contrário: dispensar o Van Halen era o que precisava ser feito naquele momento.
“Graças a Deus (não trabalhamos com o Van Halen). A razão pela qual dissemos ‘não’ foi porque… Gene gosta de olhar e fazer coisas diferentes. Porém, especialmente no início da carreira do Kiss, envolver-se em outros projetos nos prejudicaria.”

Conflito de versões no Kiss
Paul Stanley refutou a hipótese de simplesmente não ter se empolgado com a música de Eddie Van Halen e companhia. Para ele, a decisão foi tomada de modo estratégico.
“Era impossível ouvir Van Halen e não achá-los ótimos. Bill (Aucoin, empresário do Kiss) sabia disso. Eu estava com Gene quando ele viu o Van Halen pela primeira vez no Starwood. Mas a ideia de administrar ou produzir bandas quando ainda estávamos no início da carreira era algo que… essa atitude se chama autopreservação.”

Em outra entrevista, porém, Gene Simmons garantiu que o colega não se importou com o grupo que logo estouraria com “Runnin’ with the Devil”, a revolucionária instrumental “Eruption”, o cover de “You Really Got Me” (The Kinks), entre outros. Ao livro Unchained, de Paul Brannigan, ele disse:
“Todos deram de ombros e disseram: ‘e daí?’. E eu disse: ‘Você está me matando! Como assim e daí? Escute isso!’. […] [Por conta disso] Rasguei o contrato do Van Halen e disse: ‘vocês estão livres’. Eu disse: ‘vamos sair em turnê com o Kiss e, quando eu voltar, se você não tiver um acordo, eu volto e tento te ajudar, mas, neste momento, não me sinto ético em vender sua demo porque o resto da galera não entende’.”
O destino do Van Halen
Felizmente, o destino sorriu para o Van Halen após Gene Simmons sair de cena. Doug Messenger, então guitarrista de Van Morrison, indicou a banda para o produtor Ted Templeman, que estava atrás de artistas com aquele tipo de sonoridade. Templeman os trouxe para a Warner Records e o primeiro álbum, homônimo, saiu em 1978. O sucesso foi tamanho que, hoje, o disco acumula mais de 10 milhões de cópias vendidas somente nos Estados Unidos.
Por outro lado, o quarteto logo contraiu uma enorme dívida. O contrato oferecido pela Warner previa que a banda receberia apenas 70 centavos de dólar por disco vendido. Como resultado, eles passaram a dever mais de US$ 1 milhão ao concluir sua primeira turnê, abrindo para o Journey. Apesar disso, o grupo trabalhou com a gravadora durante praticamente toda a sua existência.
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Fonte: rollingstone.com.br