PUBLICIDADE

Lula negligenciou risco de sanções dos EUA por mais de um ano


Já no primeiro semestre de 2024, bem antes da vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais americanas, em novembro último, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) alertava para o risco de o Brasil ser alvo de sanções dos Estados Unidos devido ao ativismo judicial e à perseguição política contra a oposição conservadora a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Mas a decisão brasileira de manter postura de confronto ideológico com Trump – desde a campanha eleitoral dele – e apostar no desinteresse de confronto mostrou-se equivocada. As sanções americanas inéditas contra autoridades do Judiciário e a taxação de 50% sobre produtos do país – por razões políticas – foram precedidas por uma escalada de advertências.

Eduardo articulava abertamente com parlamentares dos Estados Unidos, em um movimento reforçado por outros congressistas brasileiros e americanos. Apesar disso, tanto o Palácio do Planalto quanto o Itamaraty optaram por ignorar sinais crescentes de insatisfação — ainda sob a gestão do ex-presidente americano Joe Biden — e a promessa do candidato Trump de restaurar o protagonismo dos EUA.

Inicialmente tratado com desdém, o movimento evoluiu até culminar, depois de pouco mais de um ano, na condenação pública de Trump à perseguição judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Mesmo após os primeiros alertas do Departamento de Estado, a diplomacia brasileira limitou-se a notas de repúdio, sem abrir canais concretos de negociação.

Resultado: o tarifaço assinado por Trump, que entra em vigor em 6 de agosto, e a inclusão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), na lista de sanções da Lei Global Magnitsky, também oficializada nesta quarta-feira (30), inauguraram o pior nível de tensão nas relações entre Estados Unidos e Brasil em cerca de 200 anos.

A medida contra Moraes visa isolá-lo do sistema financeiro e corporativo ligado aos Estados Unidos. Caso o STF tente reagir obrigando empresas no Brasil a desconsiderar as sanções, o país poderá mergulhar em um cenário de insegurança jurídica e grave atrito institucional.

Bolsonaro é réu no processo no STF conduzido ostensivamente pelo ministro Moraes por suposta trama de golpe de Estado e, desde o recente anúncio das medidas americanas, está usando tornozeleira eletrônica e impedido de usar redes sociais, sob constante risco de prisão.

Governo mostrou-se despreparado com tarifaço vinculado a demanda política

Em 7 de julho, o presidente americano mencionou que o processo contra Bolsonaro era uma “caça às bruxas”, por meio de uma publicação em sua rede social Truth Social. Nesta mensagem, ele afirmou que o ex-presidente brasileiro “é alvo de perseguição” e pediu que o deixassem em paz. Lula, por sua vez, agravou o cenário com declarações e ataques pessoais a Trump.

Trump enviou, em 9 de julho, carta a Lula, condenando o julgamento de Bolsonaro e anunciou as tarifas de 50% para produtos brasileiros vendidos para os Estados Unidos. Depois, ministros do STF e familiares tiveram vistos de entrada nos EUA cancelados e ainda estão ameaçados pela Lei Magnitsky, com duras penas financeiras a violadores de direitos humanos, como já ocorreu com Alexandre de Moraes.

Em 23 de junho de 2024, reportagem da Gazeta do Povo já apontava o risco de sanções dos EUA, conforme advertência feita por Eduardo Bolsonaro. Dias antes, o parlamentar sublinhou que o Brasil poderia seguir o mesmo caminho da Bielorrússia e ser alvo de medidas punitivas do Judiciário brasileiro contra liberdades civis e prerrogativas parlamentares.

Na época, o deputado Chris Smith, presidente do Subcomitê de Direitos Humanos da Câmara dos EUA, enviou uma carta ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, denunciando “relatos alarmantes” de perseguição política, censura e má conduta judicial. Smith cobrou respostas sobre ações que configuravam “graves violações ” por parte do Estado brasileiro.

Entre os pontos questionados estavam censura prévia a jornalistas, fechamento de veículos de imprensa, sanções contra parlamentares e uso de mecanismos internacionais — como a Interpol — para assediar cidadãos. Ordens judiciais contra empresas e indivíduos fora da jurisdição brasileira, lesivas à soberania americana, foram depois alvo de ações na Justiça dos EUA e endossadas até por parecer do Ministério da Justiça do governo Lula concordando que Moraes tem poderes limitados ao território brasileiro.

Reação tardia é sinal de impotência do país diante dos fatos, diz analista

“Há várias delegações brasileiras em Washington sem qualquer previsão de audiência com o presidente Trump ou autoridades próximas a ele. O chanceler brasileiro custou a fazer contato com o seu homólogo, Marco Rubio, pouco antes de o tarifaço entrar em vigor”, observa Daniel Afonso Silva, professor de relações internacionais da USP.

Para ele, o Planalto e o Itamaraty perderam tempo precioso e agora é tarde para reverter o quadro. “No curto prazo, a supertarifação parece irreversível. Mas, no médio, talvez Lula encare o papel de presidente da República e dialogue diretamente com Trump e apresente concessões — o que, no fundo, é o que o presidente americano realmente deseja”, afirma.

Silva aponta três hipóteses para a inação do governo: ausência crônica de coordenação e liderança (situação que perdura desde o 8 de janeiro), subestimação do impacto econômico das tarifas ou, mais grave, plena consciência do cenário, acompanhada de paralisia diante da percepção de impotência frente à decisão dos EUA.

Juan Carlos Arruda, diretor-geral do Ranking dos Políticos, acredita que o governo tende a adotar medidas pontuais para amenizar os danos do tarifaço, mas a falta de coordenação e o tom dado por Lula “dificultam a construção de uma estratégia sólida”. “As reações do governo oscilam entre declarações agressivas e improvisos de compensação”, resumiu.

Discurso de Lula na crise cristaliza impasse com pouca chance de reversão

Enquanto o governo brasileiro não consegue avançar diplomaticamente, Lula tem endurecido o discurso em entrevistas, limitando qualquer diálogo com Trump a temas estritamente econômicos. A retórica agrada parte da base eleitoral do petista, mas cristaliza o impasse e afasta a negociação.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), segue dizendo que os “canais sempre estiveram abertos”. Ele propôs medidas como créditos extraordinários e financiamentos públicos — o que traz novos riscos fiscais. Governadores de estados mais atingidos recusaram reunião com o vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin (PSB), a autoridade de fato engajada no tema.

Para analistas, Lula contribuiu para a crise com críticas gratuitas à gestão Trump e atuação abertamente contrária aos interesses americanos no bloco diplomático dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia, Irã e Indonésia) como o apoio à desdolarização.  Agora, o presidente brasileiro usa da crise para se fortalecer eleitoralmente. Nesse meio tempo, os Estados Unidos já firmaram acordos para reduzir tarifas com grandes parceiros, como União Europeia, Japão, Reino Unido e Índia. O Brasil foi para o fim da fila.



Fonte: Revista Oeste

Leia mais

PUBLICIDADE