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Escalada da crise entre Brasil e EUA cobra reação do Congresso


A pressão dos Estados Unidos sobre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF) – escalada nos últimos dias, após a ameaça americana de ampliar aos aliados do ministro Alexandre de Moraes, do STF, as sanções já impostas a ele – deve atingir novo ápice nesta semana, com o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Corte, pela suposta tentativa de golpe, entrando em sua reta final.

Com Lula e o STF resistindo às investidas de Washington, apelando a mais críticas e ao argumento de estarem defendendo a soberania nacional, a saída para a crise diplomática e comercial recai sobre o Congresso, travado por impasses. A oposição ainda cobra, sem qualquer garantia, a votação da anistia do 8 de janeiro, fim do foro privilegiado e impeachment de Moraes. Dessas medidas, até o momento, a PEC do foro é a que tem perspectiva de avanço.

Nesta mesma quarta-feira (13) – data em que vencem o prazo para as alegações finais da defesa de Bolsonaro e sete réus no STF -, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o jornalista Paulo Figueiredo irão à Casa Branca, convidados pelo governo americano a atualizarem o cenário doméstico no Brasil. A perspectiva é de que Moraes faça logo seu voto e o ex-presidente seja condenado em breve.

Enquanto isso, Lula articula publicamente apoio conjunto dos países do Brics contra o tarifaço de 50% dos EUA sobre produtos brasileiros, que entrou em vigor na última terça-feira (6). O presidente até conversou por telefone nos últimos dias com os chefes de Estado de Índia, Rússia e China.

Já no Congresso Nacional, disputas persistem após as tensas obstruções de plenário e os desdobramentos tanto quanto às pautas de interesse da oposição quanto de possíveis punições aos envolvidos ainda são aguardados.

Inação dos três Poderes pode levar à ruptura das relações entre Brasil e EUA

Para especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo, a postura do Palácio do Planalto, do Ministério da Fazenda e do Itamaraty – dando verniz ideológico à contenda com a gestão do presidente Donald Trump – alimenta as especulações de possível ruptura nas relações bilaterais, por parte dos EUA. E a inação do STF esconde o pavor de ministros com o risco de serem sancionados pela Lei Magnitsky.

João Henrique Vieira Hummel, da consultoria Action, avalia que a reação do Congresso poderia ser a mais efetiva, sendo que sua demora traz sinais inquietantes. “O desafio de dezenas de deputados à Mesa, para votar certas pautas, mostra que sabem da autonomia dada pelas emendas parlamentares. Mas eles ainda têm de aprender a exercer esse poder”, diz.

Segundo Hummel, tanto parlamentares sem expressão do chamado baixo clero quanto os líderes não perceberam seu papel histórico na crise de nível internacional. “Até quando o Congresso vai deixar sua responsabilidade ser exercida pelos EUA? São os legisladores que têm o poder de agir e corrigir rumos numa república, colocando cada poder em seu lugar”, desafia.

Marcus Deois, diretor da consultoria Ética, acrescenta algo que pode anular o diálogo bilateral e exigir respostas do Congresso: Lula pediu aos ministros envolvidos na negociação que elaborem lista de produtos e serviços dos EUA passíveis de retaliação, com base na reciprocidade. Até lá, o Executivo reage ao tarifaço só com promessas de socorro a exportadores afetados.

Política dos EUA de combate às facções criminosas pode prejudicar diálogo

O cientista político Leonardo Barreto, da Think Policy, destaca um novo fator de pressão dos EUA na crise comercial com bases políticas e jurídicas: a política do governo de Donald Trump de considerar o crime organizado ameaça à segurança nacional, classificando as facções como entidades terroristas – o que é rechaçado por Lula – e autorizando ações de força onde estiverem.

A Casa Branca vê a infiltração política dessas organizações como razão de desestabilização em países parceiros e rotulou o ditador venezuelano Nicolás Maduro como líder de cartel de narcotraficantes — sinal de que a combinação entre crime organizado e enfraquecimento institucional é uma preocupação central do atual governo Trump para a América Latina.

“Para o Brasil, o tema representa mais um ponto de atrito, já que o governo Lula resiste a enquadrar o crime organizado como atividade terrorista, dificultando a cooperação bilateral. A falta de colaboração nesse ponto é outro fator de afastamento dos dois países”, sublinha Barreto. O especialista vê negociações sendo prejudicadas pela ausência de análise de cenários.

Juan Carlos Arruda, diretor-geral do Ranking dos Políticos, vê, contudo, a prisão domiciliar de Bolsonaro, determinada por Moraes por suposto descumprimento de medidas cautelares, como principal fator de tensão nas relações bilaterais. Ele aponta críticas de juristas à fragilidade das medidas e insegurança jurídica.

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Oposição tenta superar impasse no Congresso após semana turbulenta

O retorno do recesso parlamentar na semana passada reabriu disputas e negociações no Congresso, mais tensionadas após a prisão domiciliar de Bolsonaro. Na Câmara, a oposição obstruiu os trabalhos até quarta-feira (6), exigindo a votação da anistia aos réus do 8 de janeiro o fim do foro privilegiado. A obstrução física terminou após acordo informal entre líderes partidários.

Manifestantes do PL e outros do centro recuaram, negando que o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), tenha prometido pautar os temas. Um grupo de 14 deputados está agora sob ameaça de punição. No Senado, o presidente Davi Alcolumbre (União-AP) reassumiu logo o comando da Mesa e avisou que não pautará o impeachment de Moraes.

A oposição conta com 41 assinaturas de apoio ao impeachment, número suficiente para abrir o processo, mas são necessários 54 votos para aprovação final. Enquanto isso, a base governista busca se reorganizar para avançar em pautas como a isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil, a PEC da Segurança, o Plano Nacional de Educação e medidas provisórias relevantes.

Analistas apontam que a maior barreira para as pautas da oposição não é a força política do Executivo, mas a configuração institucional, com a aliança entre governo e STF, e o perfil pragmático do Centrão — bloco informal sem orientação ideológica firme. Esse arranjo cria uma blindagem que dificulta o avanço de mudanças estruturais e reações contra decisões judiciais.

Casa Branca abre portas a críticos de Lula e suspende reunião com Haddad

A Casa Branca receberá nos próximos dias 13 e 14 o deputado Eduardo Bolsonaro e o jornalista Paulo Figueiredo, que se reunirão com auxiliares de Trump para relatar o cenário político e jurídico no Brasil. Até agora, o governo americano já impôs a maior das tarifas às importações brasileiras, sancionou Moraes e chamou o processo contra Bolsonaro de “caça às bruxas”. Nos últimos dias, novas ameaças foram feitas por comunicados do Departamento de Estado e declarações de conselheiros do presidente.

Paralelamente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve cancelada uma reunião virtual com o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, que discutiria o tarifaço. Haddad atribuiu a suspensão à “militância antidiplomática” da “extrema-direita” brasileira, sem citar Eduardo Bolsonaro.

O deputado culpou a incompetência do ministro e o viés antiamericano do governo Lula pelo cancelamento da reunião. Oficialmente, Washington alegou “questões de agenda”, mas a suspensão ocorreu em meio à escalada da tensão diplomática após a prisão domiciliar de Bolsonaro.

Não há nova data prevista de reunião e o Ministério da Fazenda afirma buscar alternativas para retomar o diálogo e mitigar os impactos das sanções. Ainda há a expectativa de sanções adicionais ao país conforme os desdobramentos do julgamento de Bolsonaro no STF e investigações sobre apoio do Brasil à Rússia na Guerra da Ucrânia pela via comercial, principalmente na compra de diesel.



Fonte: Revista Oeste

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