PUBLICIDADE

Dosimetria perde força e PL dá trégua a Motta sobre anistia


Um mês após a Câmara dos Deputados aprovar o regime de urgência do projeto que concede anistia a investigados e condenados pelos atos de 8 de janeiro, o tema perdeu tração política e segue sem previsão de votação. O relator, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), ainda não apresentou oficialmente seu parecer — que deve se restringir à redução de penas, e não à anistia ampla — e aguarda uma sinalização da cúpula do Congresso para garantir o avanço da matéria.

Diante do impasse, a própria bancada do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, reduziu a pressão para que o tema seja levado adiante. A nova postura ficou evidente na reunião de líderes da Câmara, na terça-feira (21), quando nenhuma liderança da oposição cobrou que o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), incluísse o projeto na pauta de votações do plenário. Segundo o líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), a decisão foi articular antes com partidos de centro para garantir apoio suficiente à aprovação.

“Foi acertado com o presidente Hugo Motta que vamos construir com os partidos de centro antes. Quando o PL for pedir para pautar, vamos aprovar com mais de 290 votos novamente”, disse o parlamentar.

O pedido de urgência foi aprovado por 311 votos a favor, 163 contra e 7 abstenções, mas, desde então, o texto não avançou. Sob a relatoria de Paulinho da Força, o texto da anistia vem ganhando nova formulação. O deputado ainda não apresentou o texto oficialmente, mas, em entrevistas, tem reforçado que será um “projeto de dosimetria”, voltado apenas à revisão das penas.

Em reuniões com as bancadas ao longo das últimas semanas, o deputado sinalizou que uma das ideias é permitir que condenados deixem o regime fechado após a nova dosimetria. Já para os integrantes do chamado “núcleo central” — que inclui Bolsonaro e outros sete réus condenados pelo STF —, a previsão seria de redução parcial de pena, sem eliminar o cumprimento de parte da prisão em regime fechado.

No caso de Bolsonaro, por exemplo, a pena aplicada pelo Supremo foi de 27 anos e três meses. Aos líderes, Hugo Motta tem reforçado que a proposta precisa ser “construída a quatro mãos”, com participação tanto da Câmara quanto do Senado, para evitar desgastes semelhantes aos da PEC da Imunidade — apelidada por seus críticos de “PEC da Blindagem” —, rejeitada pelos senadores em setembro.

Segundo Motta, o objetivo é buscar uma “solução equilibrada” para casos em que as penas tenham sido aplicadas de forma desproporcional, deixando ao Judiciário a revisão final. Mesmo que o relatório trate apenas da dosimetria, a bancada do PL não descarta a possibilidade de apresentar um destaque para incluir o perdão integral aos condenados e inelegíveis, retomando a ideia de uma anistia “ampla, geral e irrestrita”.

Pelo Regimento Interno da Câmara, o destaque é o instrumento que permite votar separadamente uma emenda ou parte de uma proposição, alterando pontos específicos do texto principal. Na prática, o mecanismo serviria para restaurar a anistia integral -mesmo que o parecer do relator se limite à redução das penas.

“Vamos discutir a possibilidade de apresentar um destaque. Eu não sei qual vai ser o texto do relator, se ele vai incluir algo e trazer uma anistia como nós desejamos”, afirmou o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG).

Já o deputado Eli Borges (PL-TO), vice-líder da Minoria, afirma que os manifestantes do 8 de janeiro foram vítimas de perseguição e defendeu o perdão imediato. “Estavam ali pessoas de bem, defendendo a democracia, exercendo um pleno direito da Constituição Federal de fazer suas manifestações. Elas foram presas. Inseriram o presidente Bolsonaro também nesse contexto. Por isso, nós precisamos da anistia já”, declarou.

Resistência de Alcolumbre no Senado esfria articulações da anistia

Líderes da Câmara dizem que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), aliado do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem sinalizado contrariedade ao texto construído pelos deputados. Nos bastidores, a avaliação é de que não adiantaria aprovar o projeto apenas para que ele emperre novamente na outra Casa do Congresso, como ocorreu com a PEC da Imunidade.

“Estamos conversando e vendo como articular melhor a votação”, disse Paulinho da Força.

Segundo o relator, ele enviou uma mensagem a Alcolumbre após as declarações de que o projeto não avançaria no Senado, mas espera que o presidente da Câmara faça as articulações necessárias. “O texto é muito simples. O que tem impactado levar ao plenário é apenas a sinalização de que o projeto não pode ficar parado no Senado”, afirmou.

Parlamentares ouvidos pela reportagem avaliam que o tema perdeu tração e que, neste momento, não há votos suficientes para aprovar nem mesmo o texto da dosimetria. A leitura é que nem o PT nem o PL devem apoiar a proposta. Outros apontam que não há garantias de que a oposição não apresente um destaque para transformar o texto em uma anistia integral.

Para a cientista política Letícia Mendes, especialista em Poder Legislativo da BMJ Consultores Associados, o tema da anistia perdeu espaço na agenda política por ser um tema de “alto custo político”.

“A anistia é uma pressão da oposição, que tem sido a principal bancada a reforçar o avanço do assunto dentro do Congresso Nacional, com algum apoio de parlamentares do Centrão. Mas é uma pauta delicada, porque a sociedade tem cobrado respostas em temas que impactam diretamente o dia a dia das pessoas — como inflação, economia e grandes reformas —, e a anistia não tem esse alcance”, aponta.

Bolsonaro e Costa Neto articularam ofensiva no Senado

O diagnóstico de que o projeto está paralisado também foi compartilhado em uma reunião entre o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o ex-presidente Jair Bolsonaro, que cumpre prisão domiciliar, na segunda-feira (20). Segundo parlamentares da legenda, ambos avaliaram que a proposta relatada por Paulinho da Força está travada por falta de empenho da cúpula do Congresso.

Bolsonaro defendeu que o partido adote uma postura mais incisiva no Senado, mas sem romper pontes com o Centrão. A orientação é poupar o presidente da Câmara, Hugo Motta, de ataques diretos — por ele ter demonstrado disposição para dialogar com a oposição — e concentrar a pressão sobre Davi Alcolumbre, para que o Senado retome as negociações.

Costa Neto, segundo aliados, comprometeu-se a ampliar a articulação no Senado com apoio do líder da bancada, Rogério Marinho (PL-RN). A sigla também avalia recorrer à obstrução das votações como forma de pressão política, caso o tema continue travado nas próximas semanas.

“Ao defendermos uma anistia, não o fazemos porque queremos anistiar crimes, até porque defendemos que aqueles que depredaram [as sedes dos Três Poderes] devem ser punidos. Nós queremos a volta da normalidade democrática, queremos que a Constituição seja cumprida, queremos que o escudo que nos protege e a lei possam voltar a vigorar em nosso país e que a discussão política, importante e essencial, aconteça neste Parlamento, no Congresso Nacional”, disse Marinho em discurso no Senado.

A articulação entre Bolsonaro e o presidente do PL foi interrompida porque um dia após a reunião Valdemar Costa Neto voltou a ser investigado pelo STF por suposto golpe e novas reuniões com o ex-presidente não foram autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes.



Fonte: Revista Oeste

Leia mais

PUBLICIDADE