Em uma audiência pública realizada nesta quinta-feira (29), na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, parlamentares da oposição voltaram a defender a aprovação do projeto de anistia para os presos dos atos do dia 8 de Janeiro de 2023, em Brasília. O encontro durou mais de 6 horas e foi marcado pela presença de familiares dos presos, que cobraram respostas políticas e denunciaram supostos maus-tratos.
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Com discursos centrados em palavras como “liberdade”, “direitos humanos”, “família” e “vulnerabilidade”, os deputados da oposição reforçaram o tom crítico ao Supremo Tribunal Federal (STF), especialmente ao ministro Alexandre de Moraes, o nome mais citado ao longo da sessão.
Logo no início da audiência, ocorreu um minuto de silêncio em memória aos condenados do 8 de janeiro que faleceram como Clériston Pereira da Cunha, o “Clezão”, que morreu de infarto na prisão em 2023.
Ao presidir a audiência, o deputado federal Hélio Lopes (PL-RJ), ressaltou uma série de “preocupações quanto às condições de custódia, ao devido processo legal e ao respeito aos direitos humanos dos presos”. Segundo ele, compete a comissão da Câmara “zelar pela observância dos direitos e garantias fundamentais, assegurando que as ações do Estado estejam pautadas nos princípios constitucionais e nos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário”.
Para o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), o país vive uma “guerra ideológica”. “Não iremos destruir a esquerda em uma batalha só. A anistia é uma das batalhas”, afirmou. Ele também classificou sua defesa da pauta como uma “questão humanitária”.
A audiência ocorreu em um momento de intensa pressão para que o projeto de anistia avance na Casa. A oposição tem adotado estratégias como obstrução, manifestações na tribuna, mobilizações nas redes e nas ruas para forçar o tema a ser pautado. Nos bastidores, no entanto, parte do próprio grupo admite que a proposta tem poucas chances de prosperar, mas a considera essencial para manter sua base mobilizada.
Esse mesmo cálculo político se refletiu em outras ações recentes, como a aprovação na Câmara da suspensão da ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin e réu no STF por envolvimento em uma trama golpista em 2022.
A presença de familiares dos detidos na audiência reforçou a cobrança por uma resposta do Legislativo. Atualmente, 84 pessoas permanecem presas por participação nos atos do 8 de Janeiro, que incluíram invasão e depredação das sedes dos Três Poderes.
Os crimes atribuídos aos participantes variam desde dano ao patrimônio público até tentativa de abolição do Estado democrático de direito. Há divergências entre os parlamentares sobre as reais motivações dos envolvidos e o enquadramento jurídico dos atos.
“Estado de exceção judicial”
A autora do livro “8 de janeiro e o direito penal do inimigo“, defensora pública Bianca Rosiére, explicou que decidiu escrever a história por ter atendido as mulheres que foram detidas após os ataques do 8 de janeiro e por ouvir vários relatos.
“Não tinha como ficar calada. O livro é um relato sobre as ilegalidades e explico porque a ação do STF é inspirada no direito penal do inimigo – modelo teórico que vai identificar um determinado grupo e estigmatizá-lo como inimigos e as pessoas serão tratadas como tal. Não temos lei que tem essas características e o que acontece hoje é uma inspiração desse modelo”, disse.
A Advogada Carolina Siebra, da Associação dos Familiares e Vitímas do 8 de janeiro, expôs o “estado de exceção judicial” e cobrou uma atitude do Congresso para acabar com as “arbitrariedades”. “A gente pode dizer que tem um AI-5 hoje na contemporaneidade, sendo ministrado pelo STF, nas pessoas dos ministros todos. E eu não digo só do ministro Alexandre de Moraes, porque os outros estão ali, são cúmplices, porque permitem que ele faça”, disse.
Nalva Brito, conselheira da OAB, relatou ter sido presa enquanto defendia os participantes dos eventos de 8 de janeiro. Ela conta que ficou presa por 34 dias, após decisão do ministro Alexandre de Moraes e que perdeu clientes por conta da “injustiça sofrida”. Segundo ela, o processo tem sido conduzido de forma ilegal e irregular, por isso defende a anistia como um “remédio paliativo” para os envolvidos. “São inocentes lutando pelos seus direitos”, disse.
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Subcomissão especial
Na última terça-feira (27), a Câmara instalou uma subcomissão especial para fiscalizar in loco denúncias de violações de direitos humanos contra os presos do 8 de Janeiro. O colegiado será presidido pelo deputado Coronel Meira (PL-PE), com Alexandre Ramagem na vice-presidência e Zucco (PL-RS) como relator. Segundo o relator, familiares denunciaram maus-tratos, tratamento degradante e violações da privacidade durante o encarceramento.
“A criação da subcomissão é um passo essencial para investigar as denúncias de maus-tratos e garantir os direitos dos presos.”, disse Zucco.
A subcomissão, composta por 12 integrantes e vinculada à Comissão de Segurança Pública, deverá produzir um relatório sobre suas investigações. A expectativa é que a oposição, especialmente os parlamentares ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, tenha predominância no grupo e utilize o espaço para reforçar a narrativa de injustiça e perseguição política.
Fonte: Revista Oeste