Parlamentares de oposição intensificaram a pressão dentro da CPMI do INSS para convocar José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após o surgimento de indícios de que o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi) teria omitido informações oficiais para firmar um acordo com o governo federal. Frei Chico é vice-presidente da entidade.
O pedido ganhou força após o relator da CPMI, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), apresentar documentos da Controladoria-Geral da União (CGU) que apontam que o sindicato omitiu a presença de Frei Chico na direção do sindicato ao renovar um Acordo de Cooperação Técnica (ACT) com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 2023 — já durante o atual governo. Os documentos foram apresentados durante a oitiva do presidente do Sindnapi, Milton Baptista de Souza Filho.
Segundo a CGU, o sindicato enviou uma declaração inverídica ao governo federal para viabilizar o acordo, contrariando a Lei nº 13.019/2014, que proíbe parcerias entre órgãos públicos e entidades dirigidas por parentes de autoridades do Poder Executivo. O documento, segundo o relator, induziu os órgãos públicos a erro e permitiu que o Sindnapi mantivesse repasses e convênios federais.
O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), reforçou a gravidade das acusações. Para ele, há indícios claros de falsidade ideológica. “Essa informação falsa leva em consideração justamente o fato de que o Frei Chico já era o vice-presidente. E isso impedia que o sindicato pudesse fazer essa contratação com o governo federal. Então, essa falsidade ideológica vicia todo o processo. E o Frei Chico está no meio desse processo”, afirmou.
Até então, um acordo político entre governo e parlamentares independentes restringiu as oitivas aos presidentes das entidades investigadas, o que deixou Frei Chico fora da lista inicial de convocados. O cenário mudou com a apresentação da apuração da CGU.
Segundo o relator da CPMI, o argumento para convocar Frei Chico agora é que, como o presidente do Sindnapi se manteve a maior parte do tempo em silêncio na sessão desta quinta-feira (9), o segundo no comando do sindicato, Frei Chico, deve ser chamado para depor. Souza Filho obteve o direito de ficar em silêncio por decisão do ministro do STF, Flávio Dino. Opositores dizem que o mesmo pode ocorrer com Frei Chico.
A bancada governista deve se mobilizar para impedir a convocação. Segundo o deputado Paulo Pimenta (PT-RS), a tese de Gaspar de chamar o segundo em comando no sindicato não tem fundamento.
Em uma de suas únicas respostas aos parlamentares, respondendo a um questionamento de Pimenta, o presidente do Sindnapi disse que Frei Chico não tinha função administrativa, mas apenas política no sindicato. Ele disse que o irmão de Lula nunca solicitou que qualquer porta fosse aberta para o sindicato no governo Lula.
O senador Eduardo Girão (Novo-CE) cobrou transparência e criticou a postura da base governista. “Eu voto a favor de todas as quebras de sigilo, de convocação, independente de governo, se é Bolsonaro, se é Lula. O que a gente está vendo é uma blindagem da bancada do governo Lula, da base dele toda, do PT, dos partidos que apoiam, vergonhosa”, declarou.
O Sindnapi é suspeito de ter movimentado R$ 507,5 milhões entre os anos de 2020 e 2025, segundo dados repassados à comissão pela Dataprev, a empresa pública de tecnologia ligada ao INSS. A entidade foi a terceira maior destinatária de repasses associativos descontados diretamente da folha de pagamento dos aposentados e pensionistas.
A defesa do sindicato, no entanto, negou as irregularidades e afirmou que provará “a lisura e legalidade de sua atuação”.
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O presidente da CPMI, o senador Carlos Viana (Podemos-MG), citou o documento da CGU com denúncias contra o atual presidente do sindicato e a “quantidade de dinheiro que foi sacado na boca do caixa pelos membros do sindicato” como argumentos para chamar Frei Chico para depor.
“Eu entendo que é urgente que coloquemos em votação a convocação do chamado Frei Chico, irmão do presidente Lula. Para que ele possa esclarecer os pontos que foram colocados e possa esclarecer qual é sua participação, especialmente nas decisões que foram tomadas”, afirmou o senador.
O deputado Paulo Pimenta (PT-RS) disse que o governo está tranquilo e repetiu a narrativa de que o “esquema de fraudes teria sido montado durante a administração do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)”, entre 2019 e 2022.
“É um discurso patético que tenta atribuir ao irmão do presidente Lula, pelo fato de ser um sindicalista, qualquer suspeição sobre sua conduta. O irmão do presidente Lula é uma pessoa honesta, uma pessoa humilde, simples, que nunca acumulou patrimônio, que nunca roubou ninguém em lugar nenhum”, afirmou o deputado gaúcho.
Viana disse que, além de frei Chico, quer convocar ainda Vinícius Marques de Carvalho, ministro da CGU. O senador disse querer esclarecer o motivo de o órgão ter segurado até agora informações sobre a ação do Sindnapi de omitir a presença do irmão de Lula em seus quadros.
Governo pode barrar requerimento de Frei Chico
Apesar do apoio de Viana à convocação de Frei Chico, a oposição avalia que o requerimento pode não ser aprovado. A preocupação é com a correlação de forças dentro da comissão, que tem maioria formada por parlamentares da base governista e já rejeitou pedidos semelhantes em votações anteriores.
Ainda na sessão desta quinta-feira (9), a CPMI derrubou o requerimento apresentado pelo deputado Carlos Jordy (PL-RJ) para a quebra de sigilo bancário e fiscal de Paulo Augusto de Araújo Boudens, ex-assessor do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). O pedido teve 17 votos contrários e 13 favoráveis.
Segundo a Polícia Federal, Boudens teria recebido cerca de R$ 3 milhões de uma investigada por lavagem de dinheiro e pagamento de propinas que teria vínculo com Antônio Carlos Camilo Antunes, conhecido como “Careca do INSS”, apontado como um dos principais articuladores do esquema de fraudes em benefícios previdenciários. Boudens e Alcolumbre foram procurados pela reportagem, mas não se manifestaram.
O mesmo cenário se repetiu em 3 de outubro, a CPMI também negou a convocação de Edson Claro Medeiros Júnior, ex-funcionário do grupo do “Careca do INSS”. Considerado um dos operadores do sistema de aliciamento de aposentados, Medeiros teria conhecimento sobre como o “Careca” atuava. Os requerimentos para ouvir o ex-funcionário foram rejeitados por 16 votos contrários e 14 favoráveis
Já em 25 de setembro, a CPMI rejeitou a convocação de Gustavo Gaspar, ex-assessor do senador Weverton Rocha (PDT-MA). O nome de Gaspar apareceu em investigações que relacionam o escritório de propriedade dele a uma empresa de assessoria, apontada pela CGU como beneficiária de contratos do Sindnapi. Segundo a oposição, o depoimento seria essencial para esclarecer transferências milionárias entre empresas envolvidas no esquema, mas o pedido foi novamente derrotado com o apoio da bancada governista. Os pedidos foram rejeitados com 19 votos contrários e 11 favoráveis.
CPMI aprovou quebras de sigilo de dirigentes do Sindnapi
Dentre os requerimentos aprovados nesta quinta-feira, a CPMI aprovou a quebra dos sigilos bancário e fiscal de dirigentes ligados ao Sindnapi. Foram atingidos pelas quebras de sigilo o presidente do Sindnapi, Milton Baptista de Souza Filho, e a esposa, Daugliesi Giacomasi Souza; e o ex-presidente da entidade, João Batista Inocentini, falecido em 2023.
O colegiado também encaminhou um pedido ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para enviar relatórios sobre movimentações financeiras dos investigados.
Mais cedo, a entidade foi alvo da nova fase da Operação Sem Desconto. A ação buscou documentos e bens referentes ao esquema de descontos indevidos de aposentados e pensionistas do INSS, que gerou um prejuízo estimado em R$ 6,3 bilhões entre os anos de 2019 e 2024.
Fonte: Revista Oeste