O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) usou o discurso de abertura da 80ª Assembleia Geral da ONU, nesta terça-feira (23) para atacar a política americana que elevou em 50% as tarifas de produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos e criticar sanções impostas a servidores do Executivo e o ministro do Supremo, Alexandre de Moraes.
“Não há justificativas para medidas unilaterais e arbitrárias contra nossas instituições e nossa economia”, disse Lula sem mencionar diretamente os Estados Unidos ou o presidente Donald Trump.
Contudo, Trump disse que se encontrou com Lula nos bastidores o abraçou e disse que os dois se encontrarão em breve. “Ele não gosta de mim e eu não gosto dele”, afirmou Trump.
“Assistimos à consolidação de uma desordem internacional marcada por seguidas concessões à política do poder. Atentados à soberania, sanções arbitrárias e intervenções unilaterais estão se tornando a regra. Existe um evidente paralelo entre a crise do multilateralismo e o enfraquecimento da democracia. O autoritarismo se fortalece quando nos omitimos frente a arbitrariedades”, disse o presidente brasileiro.
Lula também culpou a tarifação contra ao que chama de “extrema direita subserviente” e “falsos patriotas” em uma referência indireta ao deputado Eduardo Bolsonaro. O presidente brasileiro também mencionou a condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas sem mencioná-lo diretamente.
“Mesmo sob ataques sem precedentes, o Brasil optou por resistir e defender sua democracia, reconquistada há 40 anos pelo seu povo, depois de duas décadas de governo ditatoriais. Não justificativa para medidas unilaterais e arbitrárias contra as nossas instituições e a nossa economia.”
O discurso também foi usado pelo petista para defender a censura nas redes sociais. “Regular não é restringir a liberdade de expressão”, disse Lula. Ele afirmou que quem é contrária à regulaçnao quer encobrir interesses excusos.
O presidente brasileiro foi o primeiro chefe de Estado a discursar, seguindo a tradição da ONU do Brasil abrir os discursos. Seu discurso atraiu a atenção da mídia e de analistas internacionais pelo fato de Lula falar logo antes do americano Donald Trump. Lula é tem destoado de outros chefes de Estado ao criticar publicamente a política tarifária americana.
O discurso ocorreu após pronunciamentos do secretário-geral da ONU, Antônio Guterres e da atual presidente da Assembleia Geral, Annalena Baerbock.
Lula também usou seu discurso para criticar Israel e defender o reconhecimento internacional de um Estado palestino. “Nada justifica o genocídio em curso em Gaza”, disse Lula, que também disse que “os atentados terroristas perpetrados pelo Hamas são indefensáveis sob qualquer ângulo”.
“O povo palestino corre o risco de desaparecer. Só sobreviverá com um Estado independente e integrado à comunidade internacional. Esta é a solução defendida por mais de 150 membros da ONU, reafirmada ontem, aqui neste mesmo plenário, mas obstruída por um único veto. É lamentável que o presidente Mahmoud Abbas tenha sido impedido pelo país anfitrião de ocupar a bancada da Palestina nesse momento histórico”.
Já o presidente americano disse que o reconhecimento do Estado palestino é uma recompensa para os atentados terroristas do Hamas em outubro de 2023. Nos últimos dias, Reino Unido, Canadá, França, Portugal e Austrália oficializaram o reconhecimento em uma tentativa de pressionar Israel a assinar um cessar-fogo com o Hamas. O Brasil havia feito o reconhecimento em 2010 durante o governo Lula.
Trump culpou o Hamas e não Israel pela guerra e disse que um cessar-fogo vai acontecer quando o grupo terrorista devolver os últimos 20 reféns que estão vivos e os corpos de outros 38.
No campo da geopolítica, Lula também criticou os EUA por classificar Cuba como nação patrocinadora do terrorismo e defendeu a Rússia ao dizer que “preocupações de segurança de todas as partes”. A frase faz referência à falsa acusação de Moscou de que a Rússia estaria sendo ameaçada por uma expansão militar da Otan (aliança militar ocidental) para perto de suas fronteiras.
Lula confronta países ricos e pressiona líderes por compromissos na COP30
Logo após mencionar os conflitos que estão ocorrendo no mundo, Lula declarou que “bombas e armas nucleares não vão nos proteger da crise climática”. O petista disse que a COP30, a conferência mundial do clima, que será realizada em Belém do Pará, será “a COP da verdade”, momento em que os líderes mundiais terão de demonstrar a seriedade de seus compromissos ambientais.
“Em Belém, o mundo vai conhecer a realidade da Amazônia. O Brasil já reduziu pela metade o desmatamento na região nos dois últimos anos. Erradicá-lo requer garantir condições dignas de vida para seus milhões de habitantes”, disse Lula.
Lula também acusou os países ricos de manterem padrões de vida baseados em “duzentos anos de emissões”. “A corrida por minerais críticos, essenciais para a transição energética, não pode reproduzir a lógica predatória que marcou os últimos séculos”, apontou o petista em seu discurso.
Ele ainda defendeu que um maior acesso a recursos e tecnologias pelos países em desenvolvimento não seja visto como caridade, mas como “uma questão de justiça”. A defesa ocorreu ao anunciar a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, voltado a remunerar países que mantêm suas florestas em pé.
EUA pressionam o Brasil com sanções e restrições de vistos
Os Estados Unidos anunciaram recentemente um pacote de medidas contra o Brasil que inclui a taxação de 50% sobre produtos importados, sanções aplicadas no âmbito da Lei Magnitsky e a suspensão de vistos para autoridades brasileiras. As decisões foram justificadas por Washington como resposta a violações de direitos humanos e práticas consideradas antidemocráticas no país, inserindo o Brasil em uma lista de nações sujeitas a restrições diplomáticas e econômicas. A medida representa um endurecimento significativo nas relações bilaterais.
No âmbito da Lei Magnitsky, o governo norte-americano sancionou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, sua esposa, Viviane Barci de Moraes, e ao Instituto Lex, empresa ligada à família. As sanções envolvem congelamento de eventuais ativos em território norte-americano, bloqueio de transações financeiras sob jurisdição dos Estados Unidos e proibição de negócios com cidadãos ou companhias americanas. A inclusão de um magistrado da mais alta corte brasileira e de seus familiares nessa lista eleva o patamar da crise, sinalizando que Washington considera que as ações atribuídas a Moraes não se restringem ao debate interno, mas violam princípios internacionais de direitos e liberdades.
Além disso, o Departamento de Estado de Donald Trump também suspendeu a emissão e cancelou vistos para autoridades brasileiras, afetando diretamente integrantes do Judiciário e membros do Executivo considerados próximos às práticas criticadas por Washington. Entre os atingidos, segundo fontes diplomáticas, estão o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o advogado-geral da União (AGU), Jorge Messias, além de antigos aliados de Moraes, que terão restrições para entrar em território norte-americano. A medida dificulta negociações bilaterais, afasta empresários e políticos do acesso a fóruns internacionais nos Estados Unidos e amplia a percepção de isolamento diplomático do Brasil no cenário ocidental.
As sanções americanas são respostas de Trump à perseguição política ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e às ações de censura do Supremo Tribunal Federal (STF) nas redes sociais, além da posição geopolítica do Brasil.
Fonte: Revista Oeste