A escolha do deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) como relator da proposta de anistia aos condenados do 8 de Janeiro gerou forte reação na oposição e abriu uma disputa sobre o rumo do texto. Paulinho da Força sinalizou, no mesmo dia que foi anunciado como relator, que não pretende apresentar uma anistia ampla, geral e irrestrita, mas sim um “PL da Dosimetria”, voltado à redução de penas.
O posicionamento desagradou ao PL e a aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O líder do PL na Câmara dos Deputados, Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ) reagiu. À Globonews disse nesta sexta-feira (19) que “ou aprova anistia, ou Paulinho pede para sair”.
Sóstenes Cavalcante rechaçou a possibilidade de substituir a anistia por uma redução de penas. “Não aceitamos. Onde já se viu alguém da direita votar para reduzir pena? Quem reduz pena é a esquerda. Ou aprova a anistia ou Paulinho pede para sair”, afirmou, ressaltando que levará a posição para a bancada do partido na próxima semana.
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Reunião com ministros do STF e ex-presidente também gerou desconforto
Outro ponto que gerou críticas entre a oposição tratou do encontro entre Paulinho da Força, o ex-presidente Michel Temer (MDB) e Aécio Neves (PSDB-MG). Durante a reunião, também acompanhada remotamente pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e pelos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes (STF), teria ficado previamente acordado que o texto deveria se concentrar na redução de penas.
Temer defendeu publicamente que a proposta seja construída para “pacificar o país”, com apoio do Executivo e do Judiciário. Segundo ele, a dosimetria deve alcançar inclusive Bolsonaro e militares condenados.
O deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO) classificou a escolha de Paulinho da Força e a forma como pretende conduzir o projeto como “frustrante” e afirmou que o entusiasmo após a vitória no plenário se transformou em decepção. “Esperávamos um relator de centro, de direita, ou até um pouco mais à esquerda. Mas com Paulinho, um aliado do governo, isso ficou difícil”, criticou.
Chrisóstomo também levantou dúvidas sobre a proximidade do relator com ministros do STF, em especial Alexandre de Moraes. Para ele, essa relação pode influenciar negativamente a construção do texto. “Se formos pensar na amizade, está totalmente desfavorável para nós, porque o próprio ministro Moraes se mostra contrário à direita. Essa relação próxima nos deixa de joelhos”, afirmou.
O parlamentar ainda rejeitou a possibilidade de uma anistia parcial, que excluísse o ex-presidente Jair Bolsonaro. “Anistia é perdão. Ou você perdoa ou não perdoa. Não existe meia anistia. Ela precisa ser ampla, geral e irrestrita”, defendeu. Ele acrescentou que a oposição já articula com senadores para tentar garantir apoio no caso de o texto avançar para o Senado. “Estamos atentos e conversando. Quando o PL da Anistia chegar lá, queremos que seja favorável e faça justiça a todos os presos”, disse.
O texto deve propor mudanças no Código Penal para reduzir penas estendendo os efeitos aos já condenados. Isso beneficiaria todos os envolvidos no 8 de janeiro. Atualmente, 141 pessoas permanecem presas, e o STF já condenou Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão em regime fechado.
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Paulinho da Força diz que redução de pena ainda está em debate
Segundo Paulinho da Força, ainda será discutido com as bancadas o “tamanho da dose” de redução das penas que será aplicada. A Câmara aprovou na última terça-feira (17) o regime de urgência para a matéria, com base no PL 2.162/2023, apresentado por Marcelo Crivella (Republicanos-RJ).
A medida permite que o projeto vá direto a plenário sem passar pelas comissões. Paulinho da Força afirmou que o texto deve ser apresentado em no máximo duas semanas. O conteúdo final, porém, será definido pelo relator, mas é alvo de amplas críticas.
A escolha de Paulinho da Força e a forma como ele pretende conduzir o processo também foi alvo de críticas de setores ligados a Bolsonaro. O influenciador Paulo Figueiredo, que está com o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) nos Estados Unidos, disse que “relator é só relator” e que o “texto que vai ser construído é o da maioria”. “Nenhum texto passa sem o PL. Agora vai ser aumentar a pressão”, declarou, ao considerar que novas sanções podem vir dos EUA caso a proposta não contemple uma anistia.
Ao criticar de forma indireta a relação de Paulinho com ministros do STF, Eduardo Bolsonaro escreveu no X que “o regime resgata das profundezas seus ‘pupets’ [fantoches], endividados com seus algozes, para servirem de porta-vozes da ‘moderação’. Não adiantará. Anistia é sobre fatos”, escreveu.
Para se defender das críticas que tem recebido da direita, Paulinho da Força publicou um vídeo do presidente nacional do Progressistas (PP), senador Ciro Nogueira (PI), sinalizando para um entendimento político em torno do projeto de anistia. Embora tenha reiterado sua posição a favor de uma “anistia ampla e irrestrita”, o parlamentar reconheceu que o tema divide o país e admitiu a possibilidade de discutir alternativas, como a proposta de dosimetria das penas.
“Há muito tempo a gente deveria ter decidido isso. Nós temos um país tão dividido, a missão não é fácil. Tem pessoas que, como eu, defendem a ampla e geral. Tem pessoas que defendem anistia nenhuma. Então você vai ter que fazer um projeto escutando todas as pessoas. Eu tenho certeza que nós temos que sair desse processo muito melhor do que nós estamos hoje. O Brasil não aguenta mais essa discussão sem fim”, declarou o senador.
Para Nogueira, o desafio central será encontrar um ponto de convergência entre as diferentes correntes políticas e encerrar o impasse em torno do tema.
Relator da anistia tem histórico de proximidade com o STF e mudança de posição sobre o tema
Assim como mostrou a Gazeta do Povo nessa quinta-feira (18) a escolha de Paulinho da Força como relator reacendeu debates em Brasília sobre sua trajetória política e sua relação com o STF. O parlamentar, que inicialmente se posicionava contra a anistia, passou a defender uma proposta centrada na redução de penas, descartando a ideia de perdão “amplo, geral e irrestrito” defendida por setores da oposição.
Em 2023, Paulinho classificou os atos como “terrorismo” e elogiou a intervenção federal decretada no Distrito Federal, além de ressaltar que não se tratava de liberdade de expressão, mas de crime contra os Três Poderes. Naquele mesmo ano, foi absolvido pelo STF em um processo que apurava desvios em operações do BNDES, revertendo uma condenação da Primeira Turma que havia fixado pena superior a dez anos. A decisão permitiu seu retorno à Câmara.
Paulinho tem cultivado uma relação próxima com integrantes do Supremo, em especial com Moraes, a quem já chamou de “guardião da democracia”. Em 2024, divulgou nota de apoio ao ministro por sua atuação no “combate às fake News”. O deputado também acionou a Corte contra propostas de emenda constitucional que buscavam limitar os poderes do STF, classificando-as como ameaças à estabilidade democrática.
Durante sua primeira entrevista como relator da anistia, o parlamentar afirmou conhecer Moraes desde os tempos em que o ministro atuava como advogado em São Paulo, e destacou a importância de dialogar com o Judiciário para a formulação do texto. Paulinho da Força foi um apoiador próximo de Lula, inclusive nas eleições de 2022 contra Bolsonaro, mas rompeu com o governo, alegando falta de espaço para o Solidariedade na distribuição de cargos.
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Fonte: Revista Oeste