A decisão emitida nesta segunda-feira (18) pelo ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que impede a aplicação de sanções estrangeiras no Brasil sem aval da Corte, interpretada também como uma tentativa de blindar o ministro Alexandre de Moraes dos efeitos da Lei Magnitsky, deixou perplexos os executivos de grandes bancos que atuam no país.
Diretores do setor classificaram à coluna de Lauro Jardim, no jornal O Globo, a medida como “incumprível”, já que instituições financeiras brasileiras dependem de provedores de infraestrutura americanos e mantêm operações nos Estados Unidos, o que as obriga a seguir determinações do Tesouro dos EUA, que foi quem aplicou sanções contra Moraes.
Em comunicado divulgado nesta segunda-feira, momentos após a decisão de Dino, a Embaixada dos EUA no Brasil foi clara ao especificar que “pessoas e entidades sob jurisdição dos EUA estão proibidas de manter qualquer relação comercial” com o ministro Moraes e que “nenhum tribunal estrangeiro pode anular as sanções impostas pelos EUA ou proteger alguém das severas consequências de descumpri-las.”
Caso se vejam obrigadas a seguirem as ordens do STF e tentem driblar as sanções americanas, instituições financeiras que operam em solo brasileiro, mas que possuem escritórios ou sistemas sob jurisdição americana, poderiam enfrentar sanções secundárias ou até mesmo multas bilionárias, como já ocorreu com algumas das maiores instituições bancárias do mundo.
As punições bilionárias aplicadas pelos EUA
A experiência mostra que o Departamento do Tesouro e o Departamento de Justiça dos Estados Unidos não hesitam em aplicar multas pesadas contra instituições financeiras que tentam burlar sanções americanas. Entre os casos mais emblemáticos estão:
BNP Paribas (França)
Em 2014, o banco francês aceitou pagar US$ 8,9 bilhões após admitir que processou transações ilegais de cerca de US$ 30 bilhões com Cuba, Irã e Sudão entre 2004 e 2012. Além da multa recorde, o BNP recebeu pena de cinco anos de liberdade condicional para empresas e foi proibido temporariamente de realizar determinadas operações em dólar. Foi o primeiro grande banco condenado criminalmente nos EUA por violar sanções internacionais.
HSBC (Reino Unido)
Em 2012, o banco britânico foi multado em mais de US$ 1 bilhão por falhas sistêmicas em seus controles de compliance. Segundo os EUA, o banco permitiu tanto a lavagem de dinheiro de cartéis de drogas quanto transações com países sancionados pelo governo norte-americano, como Irã, Líbia e Sudão. O acordo incluiu um plano de monitoramento independente por cinco anos e profundas reformas internas.
Commerzbank (Alemanha)
Em 2015, o banco alemão aceitou pagar US$ 1,45 bilhão por processar transações em nome de entidades sancionadas pelos EUA no Irã e no Sudão, além de falhar em controles internos contra lavagem de dinheiro. O banco também se comprometeu a adotar medidas de compliance mais rigorosas.
Standard Chartered (Reino Unido)
Em 2019, a instituição britânica foi punida pelos EUA e Reino Unido em US$ 1,1 bilhão por violar sanções relacionadas ao Irã, Sudão, Síria, Cuba e Mianmar. Segundo o governo americano, o banco teria permitido a realização de transações financeiras para esses países, que teriam ocorrido por meio de sua unidade em Dubai. O banco teria tentado ocultar os clientes que eram ligados aos países sancionados.
ING Bank (Holanda)
Em 2012, o banco holandês foi multado em US$ 619 milhões por manipular registros e omitir informações de mais de 20 mil transações, em sua maioria ligadas a Cuba, Irã, Mianmar, Líbia e Sudão, todos alvos de sanções dos EUA.
Credit Suisse (Suíça)
Em 2009, o Credit Suisse aceitou pagar US$ 536 milhões em multas por processar centenas de milhões de dólares em operações para entidades sancionadas pelos EUA do Irã e do Sudão. Segundo o governo americano, o banco chegou a admitir que treinava clientes iranianos para mascarar transferências, de forma a escapar dos filtros do sistema financeiro americano.
Deutsche Bank (Alemanha)
Em 2015, o Deutsche Bank recebeu uma multa de US$ 258 milhões por disfarçar mais de 27 mil transações com países sancionados, entre eles o Irã, Síria, Sudão e Líbia. Como parte do acordo, o banco foi obrigado a demitir executivos envolvidos e a instalar um monitor independente de compliance.
O poder americano
Esses precedentes deixam evidente que nenhum banco internacional, por mais força que tenha, conseguiu escapar das consequências ao tentar burlar sanções americanas. Para o Tesouro dos EUA, qualquer instituição que utilize o dólar ou mantenha operações sob sua jurisdição está sujeita às regras do OFAC.
No caso brasileiro, a decisão de Flávio Dino pode ter peso político, mas, diante da prática internacional, o risco de sanções secundárias e multas bilionárias torna praticamente impossível que os bancos ignorem ordens vindas de Washington.
Fonte: Revista Oeste