O cantor Brian Wilson, de 82 anos, morreu nesta quarta-feira (11). Considerado um dos maiores músicos do século XX e icônico integrante banda de rock estadunidense Beach Boys, seu falecimento foi publicado através redes sociais do artista. A causa da morte não foi revelada, mas ele foi diagnosticado com um distúrbio neuro cognitivo em 2024.
Abaixo relembre a vida e carreira de Brian Wilson:
O legado de Wilson inclui dezenas de singles de sucesso com os Beach Boys, incluindo três que chegaram ao primeiro lugar nas paradas (“I Get Around”, “Help Me, Rhonda” e “Good Vibrations”). Na década de 1960, os Beach Boys não eram apenas a banda americana de maior sucesso — eles também competiam pela supremacia global com os Beatles. E em álbuns como Pet Sounds, as técnicas de produção orquestral e luxuosa de Wilson expandiram dramaticamente a paleta sonora do rock ‘n’ roll e mostraram como o estúdio de gravação podia ser um instrumento por si só.
Brian Wilson, nascido em 20 de junho de 1942, cresceu em Hawthorne, Califórnia, uma cidade modesta ao lado do Aeroporto de Los Angeles. Brian era o mais velho de três irmãos; seus irmãos mais novos eram Dennis e Carl.
O pai deles, Murry, era um aspirante a compositor e um tirano. “Embora ele se visse como um pai amoroso que guiava seus filhos com mão firme, ele nos abusava psicologica e fisicamente, criando feridas que nunca cicatrizaram”, escreveu Wilson em sua autobiografia de 1991.
Wilson cresceu praticando esportes e obcecado por música, ensinando seus irmãos a harmonizar com ele. A música era seu sustento e seu consolo, segundo ele: “Desde cedo, aprendi que, quando eu desligava o mundo, conseguia me sintonizar com uma música misteriosa, dada por Deus. Era o meu dom, e me permitia interpretar e entender emoções que eu não conseguia articular.”
Em 1961, Brian, Dennis e Carl formaram uma banda com o primo Mike Love e o amigo Al Jardine, gerenciada por Murry Wilson. Brian tocava baixo, assumia muitos dos vocais principais e escrevia as músicas. Assinados pela Capitol Records e batizados como The Beach Boys, eles começaram a lançar sucessos como Thunderbirds conversíveis saindo de uma linha de montagem: “Surfin’ U.S.A.” (com melodia emprestada de “Sweet Little Sixteen” de Chuck Berry), “Surfer Girl”, “Be True to Your School” e “Fun, Fun, Fun”.
Essas composições de Brian Wilson soavam como jingles absurdamente cativantes sobre o estilo de vida adolescente californiano — pranchas de surfe, lanchonetes, jogos escolares — mas, por trás da diversão, havia uma sensação real de melancolia. Às vezes isso aparecia nas letras — como na solitária “In My Room” — e outras vezes era expresso sem palavras, com as harmonias comoventes dos Beach Boys.
Wilson se tornava cada vez mais ambicioso em suas composições e experimentava novos sons — como a guitarra surf pesada e os vocais em falsete de “I Get Around”. Mas ele cedeu à pressão das turnês, tendo um colapso nervoso durante uma viagem à Europa em 1964. Decidiu que, enquanto os outros Beach Boys viajavam pelo mundo, ele ficaria em casa aperfeiçoando novo material no estúdio: quando eles voltassem à Califórnia, gravariam suas partes. Os resultados incluíram singles belíssimos como “California Girls” e o imortal álbum Pet Sounds, de 1966.
O álbum, que regularmente aparece no topo das listas dos melhores de todos os tempos (a Rolling Stone o classificou como o 2º melhor na lista dos 500 Maiores Álbuns de Todos os Tempos), foi inspirado pelo trabalho inovador dos Beatles em Rubber Soul; em troca, inspirou os Fab Four a novos níveis de experimentação em Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band.
Paul McCartney frequentemente citou Pet Sounds como uma obra-prima, destacando especialmente o uso inovador do baixo, e declarou que a dolorosa “God Only Knows” é sua música favorita de todos os tempos. O álbum foi orquestrado com instrumentos como cravos, sinos de bicicleta e latidos de cachorro. O ápice foi “Wouldn’t It Be Nice”, com letras que ansiavam por uma vida e um amor adultos.
Os outros Beach Boys, especialmente Mike Love, não ficaram impressionados comPet Sounds, e Wilson cogitou lançá-lo como um álbum solo; como álbum dos Beach Boys, teve sucesso apenas moderado nos EUA, embora sua influência tenha sido enorme e ele tenha sido reconhecido como um clássico instantâneo no Reino Unido.
Wilson seguiu com o maior single dos Beach Boys, “Good Vibrations” — três minutos e meio de emoção com theremim e múltiplas camadas vocais, gravados ao longo de seis meses em vários estúdios, ao custo de US$ 16 mil — o single mais caro da história até então.
Wilson voltou ao estúdio com planos de se superar: um álbum chamado Smile, que ele dizia ser uma “sinfonia adolescente para Deus”. Trabalhando com o letrista Van Dyke Parks, ele começou a montar uma coleção elaborada de suítes musicais, com a intenção de mudar o rumo da música popular.
Mas as sessões desmoronaram, prejudicadas pela indiferença dos outros Beach Boys, pelo consumo de maconha e LSD por Wilson, e por sua crescente instabilidade mental. Durante a gravação de “Mrs. O’Leary’s Cow”, uma peça da suíte “Elements” sobre o fogo, Wilson distribuiu capacetes de bombeiro de plástico para a orquestra e chegou a acender um fogo no estúdio para inspirá-los. Quando soube que um prédio próximo havia pegado fogo, achou que havia causado o incêndio com sua música, surtou e trancou as fitas em um cofre.
Wilson passou a maioria da década seguinte em sua mansão em Bel Air, que incluía um estúdio de gravação e uma caixa de areia na sala de estar (ele colocava o piano nela para sentir a areia sob os pés enquanto tocava). “Ele era um homem tão solitário, tão abusado e difamado, ostracizado”, disse Van Dyke Parks a Rolling Stone em 2004. “Foi um ultraje o que ele sofreu.”
Os Beach Boys continuaram sem Brian Wilson; mesmo com a queda nas vendas de álbuns, continuaram sendo uma atração popular em turnês voltadas para clássicos. Nas décadas seguintes, Wilson voltaria periodicamente à banda e às vezes até fazia turnês com eles, apesar dos processos judiciais entre os membros sobre direitos autorais e dinheiro.
Em 1988, Wilson voltou timidamente à vida pública e começou a lançar álbuns solo, começando pelo cultuado Brian Wilson, que creditava como coprodutor seu terapeuta de longa data, Dr. Eugene Landy (que mais tarde teve sua licença cassada). Comercialmente, foi superado pelas filhas de Wilson, Carnie e Wendy, que formavam dois terços do trio vocal Wilson Phillips, que vendeu dez milhões de cópias de seu álbum de estreia em 1990. Wilson se apresentou com as filhas em I Just Wasn’t Made for These Times, de 1995. No mesmo ano, lançou Orange Crate Art, uma colaboração com Van Dyke Parks.
A lenda de Smile só aumentou com o passar das décadas desde que foi abandonado; era considerado o grande álbum perdido do rock e até inspirou um romance sobre viagem no tempo (Glimpses, de Lewis Shiner), no qual o protagonista convence Wilson a concluir o disco.
Embora músicas como “Heroes and Villains” e “Surf’s Up” tenham aparecido de forma fragmentada em álbuns dos Beach Boys, assumia-se que era impossível remontar os pedaços da obra-prima de Wilson. Em 2004, no entanto, contra todas as probabilidades, Wilson completou o álbum; em uma crítica com cinco estrelas, a Rolling Stone o descreveu como “belo e engraçado, grandiosamente bobo”.
Wilson havia alcançado algo que antes parecia impossível: um final feliz. “Vou te contar algo que aprendi”, confidenciou a Rolling Stone em 2004. “É preciso esforço para ser feliz.”
Em fevereiro de 2024, poucas semanas após a morte da segunda esposa de Brian e sua empresária de longa data, Melinda, a família de Brian revelou que o cantor estava sofrendo de demência, e uma curatela foi solicitada para garantir seus cuidados contínuos.
“Essa decisão foi tomada para garantir que não haja mudanças drásticas na casa, e que Brian e as crianças que vivem com ele continuem sendo cuidados no lar onde estão”, disse o comunicado da família Wilson à época. “Brian poderá aproveitar sua família e amigos, continuar trabalhando em projetos atuais e participar das atividades que desejar.”
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Fonte: rollingstone.com.br